quinta-feira, 29 de novembro de 2007

O abuso é sempre regra

Em uma de suas instigantes poesias, A exceção e a regra Bertolt Brecht pede, quase implora para que tomemos como estranho o habitual. Essa atitude, o espartar-se diante de ou o admirar a alguma coisa é o princípio primeiro da filosofia, já apontavam os Antigos.

No nosso mundo, ninguém mais faz isso.

Toma-se por habitual as barbaridades mais absurdas e também as formas de opressão mais sutis. Aceita-se a elas, sem questionar, sem debater, sem se rebelar. Parece que não são motivos para rebeldia.

Algumas semanas atrás, escrevi no Blog que eu estava ausente em função do excesso de trabalho a que eu estava submetido. Esse é um dos absurdos sutis contra os quais não nos rebelamos. Outro absurdo, e acredito ser muito mais grave, é lermos no jornal com alguma indiferença que uma menina de 15 anos foi presa por furto (primeira ilegalidade - não se prente uma adolescente por motivos que não sejam drásticos), em uma cela de adultos (segunda ilegalidade) homens (terceira ilegalidade, um absurdo para além do imaginável). Ao longo de 26 dias, a menina foi violentada por 18 dos seus 20 "companheiros" de cela. E eu não vi o assunto ser tratado em espaços públicos, nas universidades onde freqüento, nos espaços privilegiados da mídia... estamos percebendo-o como algo cotidiano.

Por isso, o mundo precisa, mais do que nunca, de Filosofia...

Para acessar mais informações sobre este caso, clique aqui.

A poesia de Brecht:
A exceção e a regra

Estranhem o que não for estranho.
Tomem por inexplicável o habitual.
Sintam-se perplexos ante o cotidiano.
Tratem de achar um remédio para o abuso.
Mas não se esqueçam
de que o abuso é sempre a regra.

quarta-feira, 28 de novembro de 2007

Contra o emburrecimento

Pensando sobre essa questão - por que se estudar filosofia hoje?

Um dos grandes filósofos do Século XX, Heidegger, em certa fase de sua vida acreditava que a humanidade chegou na maturidade de seu desenvolvimento; alcançamos um nível de desenvolvimento intelectual, de produção de conhecimento, que não há mais novidade a se criar, apenas explorar isso que já existe. Assim, a filosofia estaria concluída, e os estudos restantes seriam meros desdobramentos de tudo o que já fora dado.
Em oposição a essa idéia, penso numa outra: imagine que uma pessoa qualquer, deste mundo civilizado do Século XXI, fosse transportada para um passado pré-histórico. Imaginemos qualquer um de nós, com todos os nossos conhecimentos, num mundo anterior à própria civilização. Naquele contexto, nosso conhecimento não valeria nada! Isso porque pouco conhecemos do mundo - não sabemos como fazer as coisas e nem porque elas funcionam. Sabemos apenas utilizá-las: nosso conhecimento é técnico.
Sabemos dirigir, mas não montar um motor. Acendemos a luz para ler à noite, mas não sabemos criar uma fonte primária de geração de energia. Sabemos muito, mas nosso saber pressupõe os recursos que existem nesse mundo. Sem esses recursos - muletas - não nos resta muito conhecimento...
Minha questão é essa: no mundo contemporâneo, a tecnologia nos emburrece. Nosso saber se limita a escolher o botão certo para apertar, e desconsidera todo o processo (de conhecimento) que gera a construção do aparato tecnológico.
Vejo, assim, um bom motivo para estudar filosofia... o mundo está emburrecendo (e nós com ele).

segunda-feira, 26 de novembro de 2007

Filosofia da educação... virtual

Como muitos sabem, estou respondendo pela coordenação do novo curso de Filosofia, na modalidade a distância, da Universidade Metodista. O curso deverá iniciar sua primeira turma em fevereiro do próximo ano. Esta nova função tem me obrigado a refletir sobre os processos de educação a dsitância.
A primeira reação da maioria das pessoas é de descrença nessa modalidade de ensino. É muito comum eu ver pessoas "torcendo" o nariz quando falo em "estudar a distância", e compreendo sua atitude: muitas das instituições de ensino estão utilizando o EaD como forma de simplesmente ampliar seus lucros, permitindo a precarização dos processos educativos. Concordo que é mais fácil uma instituição banalizar o ensino, priorizando o lucro, nesta modalidade de educação.
Há algum tempo, ouvi do vice-reitor da Metodista que um bom professor presencial é um ótimo professor no EaD. E um professor medíocre no ensino presencial, é um péssimo profissional no EaD. Concordo com a afirmação, e a estendo para as Instituições de ensino: uma boa Universidade, tem potencial para ser igualmente boa ou, quem sabe, ainda melhor no EaD. Estendo-a, também, para os alunos: um bom aluno, disciplinado aos estudos e certo de sua opção, encontrará no EaD condições de se manifestar de forma muito mais intensa do que em uma sala de aula presencial, muitas vezes lotada de estudantes - o que impede processos dialógicos efetivos e freqüentes.

Dedicarei as próximas postagens no Blog a estas duas questões:
- por que estudar em cursos a distância (e porque não fazê-lo)?
- por que estudar filosofia nos dias de hoje?

sexta-feira, 23 de novembro de 2007

Evento: Filosofia e educação

ATENÇÃO: ESTE EVENTO FOI CANCELADO
Ocorrerá em 8/12 o IV Encontro de Educadores de ABC, evento anual promovido pelo Núcleo de Filosofia com Crianças (NEFIC) e pela Faculdade Tijucussu. A exemplo das edições anteriores, o evento terá uma mesa de debate e também oficinas práticas/reflexivas (inspiradas no método das comunidades de investigação, de Matthew Lipman). As inscrições devem ser feitas no site da Faculdade (clique aqui) ou pelo telefone (11)4224-9490.
Clique na imagem para acessar o cartaz do evento e outras informações.

quinta-feira, 22 de novembro de 2007

Notícias desta América

Recentemente foi lançado o site oficial do filósofo Enrique Dussel - certamente o maior expoente atual da filosofia latino-americana. No site, além de informações diversas sobre o autor, há link para três bibliotecas virtuais que disponibilizam on line quase toda a sua obra.

O endereço do site é www.enriquedussel.org.

quarta-feira, 21 de novembro de 2007

Em breve

Olá pessoal. Nos últimos dias tenho sido cobrado por não enviar novas postagens ao Blog. Retomarei essa atividade em breve.
Obrigado (pela cobrança e) pela compreensão!

domingo, 4 de novembro de 2007

Marighella

É fácil ser revolucionário hoje. No geral, os partidos comunistas no Brasil - e em nenhum canto do mundo há tantos! Legais e ilegais, PCB, PCdoB, PCO, PSTU, PSOL, PCBr, PCML e por ai vai... - se acomodam sob a idéia de que "a revolução não está às portas" (não está prestes a acontecer), e então é melhor esperar. Ou então com a idéia de que "estamos em plena revolução permantente", de modo que qualquer manifestação insignificante ganha força de ato revolucionário...
Em 4 de novembro de 1969 tombava um dos grandes revolucionários brasileiros.
Com a envolvente paixão que só os (bons) homens da religião são capazes de empreender, foi assim que Frei Beto descreveu o contexto da morte de Marighella:

"Foi na realidade uma noite do povo", publicou O Globo em sua edição do dia seguinte. Espetáculo de gala no Estádio do Pacaembu, em São Paulo. Pelé teria festejado seu grande dia se o resultado fosse ao contrário. Mas foi o Cotíntians que marcou quatro gols no Snatos. Magnífica atuação do time od Parque São Jorge. A equipe praiana fez apenas um tento. E não foi de Pelé, foi de Edu.
Os portões foram franqueados ao público. Arquibancadas repletas, torcidas excitadas, tambores, cornetas e apitos alegrando a noite de terça-feira, 4 de novembro de 1969. Banceiras coloridas flutuavam sobre a multidão que aplaudia o desempenho de seus times.
Bem que Pelé tentou. Mas não seria ainda dessa vez. Quando ele dominava a bola, o coração da torcida batia acelerado. Poderia ocorrer a qualquer momento. rivelino, porém, robou-lhe a noite e balançou a rede adversária duas vezes. Pelé permaneceu na soma de novecentos e noventa e seis gols ao longo de sua brilhante carreira. Não seria ainda dessa vez que ele marcaria o milésimo gol.
A contagem foi aberta aos vinte e cinco minutos. Rivelino centrou forte para a pequena área, Ivair entrou livre e tocou a bola para dentro da meta do goleiro santista. A torcida corintiana explodiu: a euforia reboava, as cornetas soavam estridentes, as baterias assemelhavam-se a disparos acelerados de canhões em salvas de tiros. Aos trinta e dois minutos, Benê tentou cortar Joel e Ramos Delgado, sendo derrubado pelo primeiro. de pé esquerdo, rivelino bateu a falta, chutando entre a barreira do Santos para ver a pelota enroscar-se no fundo da cidadela de Agnaldo.
No intervalo do jogo, a torcida movimentava-se, agitada. O cheiro de suor misturava-se ao hálito úmido do clima chuvoso da noite quente. Dedos nervosos cruzavam, entre mão estendidas, dinheiro, pipocas, refrigerantes, sanduíches, amendoim torrado. Possantes holofotes cobriam com um véu branco o gramado verde do Pacaembu. Nos vestiários, os times recobravam fôlego. de súbito, um ruído metálico de microfonia ressoou pelo estádio. um ajustar de ferros puxados por corrente elétrica. Cessaram as batucadas, silenciaram as cornetas, murcharam as bandeiras em torno de seus mastros. O gramado vazio aprofundou o silêncio curioso da multidão. O locutor pediu atenção e deu a notícias, inusitada para um campo de futebol: "Foi morto pela polícia o líder terrorista Carlos Marighella".


Extraído do livro Batismo de Sangue, de Frei Betto (São Paulo, Círculo do Livro, 1982). Foi mantida a grafia da edição.

sexta-feira, 2 de novembro de 2007

Homenagem a Vattimo

A Parte Rei Revista de Filosofia (Madrid, Espanha) publicou um número especial em homenagem a Gianni Váttimo. Para quem não conhece, Vattimo é um dos autores contemporâneos problematizadores a tensão modernidade/pós-modernidade.
Além de contribuição do próprio Vattimo, a revista traz um interessante texto de Enrique Dussel, discutindo a "pós-modernidade e a trans-modernidade" (não, não é só uma mudança terminológica. Veja a "Introdução" do livro "Ética da libertação na idade da globalização e da exclusão", de Dussel, para entender melhor sobre isso) e, evidentemente, outros textos diversos.

Este número da Revista está disponível on line, clique aqui para acessá-lo.