sábado, 20 de dezembro de 2008

Recesso

Nas próximas semanas as publicações no Blog serão mais esporádicas. Aproveitarei o período de férias acadêmicas para estudar, escrever, viajar... Publicarei postagens ocasionalmente e voltarei a ativa, de verdade, no final de janeiro.
Boas festas e bom 2009 a todos!

quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

Tragtenberg em livro

Acaba de ser lançado pela Editora da Unijuí o livro Maurício Tragtenberg: Militância e Pedagogia Libertária, do meu amigo e destacado professor-militante Antonio Ozaí (clique aqui para conhecer seu blog). Repasso abaixo os breves textos de divulgação do livro, que anseio por poder ler:


Antonio Ozaí da Silva
Maurício Tragtenberg: Militância e Pedagogia Libertária
Ijuí: Editora Unijuí, 2008 (344p.)

Site: http://www.editoraunijui.com.br
Email: editorapedidos@unijui.edu.br
+ informações >>>


Este é um livro sobre um intelectual inovador a quem o Brasil ainda deve, mas que o pensamento crítico vem reconhecendo paulatinamente. Um autor que pensou e contribuiu para a educação de modo não-formal, incomum e essencialmente crítico, confiando no papel formador da negação dialética do instituído. Sem se reter aos espaços que tradicionalmente se convencionou delimitar por “acadêmicos”, como Gorki ele considerava as vivências e lutas de sua trajetória como “as minhas universidades”.

Não é gratuito, portanto, que Antonio Ozaí da Silva inicie esta obra sobre Maurício Tragtenberg esquadrinhando os contextos de sua vida e os influxos de seu engajamento militante. O tema da educação libertária não pode ser apreendido nem encerrado nos marcos investigativos do formalismo pedagógico institucional. Isto é, filosoficamente compreendida, a obra de Ozaí lida com um método de abordagem que sabe reconhecer, respeita e não elide o que lhe demanda a natureza do seu objeto de análise.

O livro esclarece, com propriedade, que Tragtenberg, ele mesmo de formação parcialmente autodidata, articula o seu princípio político-pedagógico libertário a partir da defesa da auto-organização dos trabalhadores. Crítico da cisão teoria–prática e da hierarquia intelectual manifestas no homo academicus, ele via na autogestão dos operários o modo social destes recobrarem integralmente o saber e a condição intelectual deles apartados pela classe dominante, que os marginaliza no processo do fazer, negando-lhes o do conhecer.

Com uma obra marcada pelo decantamento crítico das raízes e da natureza histórico-social da dominação burocrática, Tragtenberg levou para a análise da educação os seus princípios teóricos mais gerais. Introduzindo e impondo respeito à pedagogia libertária na universidade brasileira, atacou a ritualística adestradora da educação burocrático-formal, fazendo da defesa da autogestão educacional, da autonomia do indivíduo e da solidariedade anticoncorrencial as balizas de sua pedagogia integral e igualitária, centrada nos interesses dos educandos.

Por fim, este estudo sobre a práxis militante e educativa de Tragtenberg carrega, ainda, um interesse peculiar: na sua leitura do mestre Tragtenberg – título que ele recusaria –, essas páginas vão calando uma a uma, e revelam, de quebra, parte dos fundamentos inspiradores de onde brota o perfil engajado antielitista do próprio cientista social e educador Antonio Ozaí da Silva, manifesto em seu notável empenho, como escritor e editor, pela qualificação crítica e plural da cultura. Enquanto continuidade dessa práxis educativa igualmente informal, essas páginas compõem uma exposição que honra a justa crítica de Tragtenberg ao vetusto e socialmente inútil elitismo acadêmico.

Paulo Denisar Fraga
Professor de Filosofia, Metodologia da Ciência e Pesquisa da Universidade Federal de Alfenas, MG

Sinopse (resumo)
O leitor tem em suas mãos um livro que representa um exercício de pedagogia crítica porque rememora para as gerações atuais e futuras o pensamento e a prática do pensador social, educador e ativista político Maurício Tragtenberg, reconhecido por sua atuação libertária nos processos educativos e políticos, tanto no sistema escolar formal, quanto nas redes de movimentos sociais, e sempre empenhado em trazer para o espaço burocrático administrado da universidade a concepção do conhecimento como projeto de emancipação; bem como em realizar uma intervenção política libertária que leve para o restante da experiência social os conhecimentos construídos na universidade.

Ao discutir os vários momentos da trajetória pessoal, política e pedagógica de Maurício Tragtenberg, este livro torna explícita a intenção do autor em realizar uma possível continuidade para a pedagogia do exemplo proposta e praticada por Tragtenberg e experienciada diretamente por Antonio Ozaí da Silva, em uma demonstração de que nos processos investigativos e educativos não há sujeitos nem objetos, pois o outrora professor Tragtenberg, com sua ação pedagógica se transforma em tema de um estudo de um ex-orientando, atualmente professor, pesquisador e ativista empenhado em uma política cultural radical, e que através deste trabalho nos propicia uma espécie de sublimação da dor que sentimos com a perda daquele que consideramos "o mestre": Maurício Tragtenberg.

Walter Praxedes
Doutor em Educação pela USP e docente da Universidade Estadual de Maringá


Sobre o autor
Antonio Ozaí da Silva é graduado em Ciências Sociais pelo Centro Universitário Fundação Santo André e mestre pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo sob a orientação de Maurício Tragtenberg. É doutor em Educação pela Universidade de São Paulo sob a orientação de Nelson Piletti e professor do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Estadual de Maringá, PR. É editor dos periódicos Revista Espaço Acadêmico, Urutágua e Acta Scientiarum: Human and Social Sciences, sendo autor de inúmeros artigos e do livro História das tendências no Brasil (SP: Proposta, 1987), que teve grande repercussão no estudo da formação das organizações, grupos e partidos da esquerda brasileira.

terça-feira, 16 de dezembro de 2008

Um certo prazer

Penso que não é novidade - ao menos para quem acompanha esse Blog - que simpatizo com o chamado pensamento hedonista, desde que, como já destaquei, entenda-se o hedonismo desprovido de toda aquela carga pré-conceituosa que lhe foi imposta pela tradição filosófica, pelo menos desde Platão.
Na prática e de maneira muitíssimo simplista: se eu precisar escolher entre uma corrente filosófica que, como Aristóteles, entende que o objetivo da vida é a felicidade contemplativa; ou outra corrente que, por exemplo como Aristipo, aponta que a felicidade é algo como uma sucessão de prazeres, e portanto o que buscamos diretamente são esses prazeres; eu fico com este segundo e menos conhecido "Ari".
E é difundindo o direito aos prazeres, convido-os a conhecer o Blog do Bergamo, chef e professor de Gastronomia - o que, de alguma forma, o torna um grande "proporcionador de prazeres". Vale a pena.

segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

Educação laica?

Sobre a educação laica em nosso país (ou sobre a liberdade de escolher qualquer cor, desde que seja azul):

sábado, 13 de dezembro de 2008

O Ato nº 5

Li nesta matéria da Folha de S. Paulo que em pesquisa de campo realizada, constatou-se que 82% dos brasileiros maiores de 18 anos entrevistados nunca ouviram falar e não sabiam do que se tratava o Ato Institucional nº 5 - o AI-5 - editado pelo ditador Costa e Silva há 40 anos, em 13 de dezembro de 1968. O Ato cumpriu, pelo menos, dois papéis importantes na história do Brasil e da América Latina (visto o quanto influenciamos e favorecemos as ditaduras nos países vizinhos): primeiro e mais concreto, legalizou a opressão, possibilitando que as atrocidades cometidas pelo regime ditatorial não precisassem ser "escondidas" ou "desculpadas" - tudo era legítimo. O outro papel é, por assim dizer, simbólico. O Ato é a simbolização sintética da própria ditadura - e nós sabemos quão poderosos são os símbolos...
Embora conhecesse trechos dele, eu mesmo nunca o tinha lido na íntegra até há pouco tempo, quando o recebi de uma amiga, Teca, que desenvolvia pesquisa sobre ética e imprensa na ditadura. Caso alguém se interesse, está disponível aqui.

quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

Rábpidas & Ácidas (IV - fim)

E para concluir essa rápida série de pensamentos ácidos, que, espero, aproveitemos bem:

Estou seguro de que se Roma quisesse explicar-se de boa-fé, ela confessaria que teria preferido que todos os habitantes do Novo Mundo fossem condenados aos diabos a que os tivessem descoberto. Com efeito, não se pode perdoar Jesus Cristo por não ter feito menção dessa vasta parte do universo nos departamentos que ele concedeu aos seus apóstolos. Os selvagens da América não são judeus nem gentios, mas bem mereciam que o filho de Deus lhes delegasse ao menos um discípulo. E essa desatenção é bem deplorável para aqueles que morreram entre o tempo da vinda de Jesus Cristo e aquele em que foi feita a descoberta de suas terras
Anônimo [em Giordano Bruno Redivivo]


Nesse recenseamento de tantos horrores, incluamos, sobretudo, os 12 milhões de homens destruídos no vasto continente do Novo Mundo. Essa proscrição é, em comparação com todas as outras, o que seria o incêndio da metade da Terra comparado ao de algumas aldeias.
Jamais este desgraçado globo experimentou uma devastação mais horrível e mais generalizada, e jamais um crime foi mais bem comprovado. Las Casas, bisco de Chiapas, na Nova Espanha, tendo percorrido durante mais de trinta anos as ilhas e a terra firme descoberta, foi testemunha ocular desses trinta anos de destruição.
[...]
Las Casas diz que esses povos destruídos eram de uma espécie mansa, frágil e inocente, incapaz de causar danos e de resistir, e cuja maior parte não conhecia as vestimentas e as armas, do mesmo modo como não conhecia nossos animais domésticos.
[...]
“Tomo Deus por testemunha”, responde o digno bispo Las Casas “que caluniais esses inocentes depois de havê-los degolado. Não, não era de modo algum entre eles que reinava a pederastia e que o horror de comer a carne humana havia se introduzido [...]. Vós é que sois mais cruéis que os antropófagos, porque eu vos vi treinarem enormes cães para irem à caça de homens como se ai à caça das bestas ferozes. Eu vos vi dar vossos semelhantes para vossos cães devorarem. Eu escutei espanhóis dizerem a seus camaradas: ‘Empresta-me um lombo de índio para o almoço dos meus filas, que amanhá te devolverei um quarto’. Foi, enfim, apenas em vossas casas que vi carne humana exposta em vossas despensas, seja para vossos cães, seja para vós mesmos.
Voltaire

quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

Rápidas & Ácidas (III)

Um pouco mais do mesmo:

A partir do momento em que o prazer ou a dor deixam de se fazer ouvir (e não dirigem mais nossos passos), corremos um grande risco de nos perder. A procura de um e a fuga do outro são os únicos guias fiéis que os homens – e, de modo geral, todos os animais – têm para se orientar.
Anônimo [em Giordano Bruno Redivivo]


É fácil concluir o quanto o sábio insensível dos estóicos está distante da perfeição de nosso filósofo. Queremos um homem, e o sábio estóico não passava de um fantasma. Eles enrubesciam por causa da humanidade, enquanto nós fazemos dela nossa glória. Queremos tirar proveito das paixões, queremos fazer delas um uso racional e, por conseguinte, possível, e eles queriam loucamente aniquilar as paixões e nos pôr abaixo de nossa natureza por meio de uma insensibilidade quimérica. As paixões ligam os homens entre si, e essa ligação é para nós um doce prazer. Nós não queremos destruir nossas paixões nem ser destruídos por elas...
César Chesneau du Marsais


Homo sum, et nihil humani a me alienum puto (Sou homem, e nada daquilo que diz respeito à humanidade deve me ser estranho)
Terêncio (citado por Cheneau du Marsais)

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

Rápidas & Ácidas (II)

Continuando, na linha da postagem anterior:

Toda ciência que não nos torna melhores é inútil e quase sempre perigosa.
César Chesneau du Marsais


A descoberta da verdade sempre foi o maior obstáculo aos sistemas de religião. E é por isso que os padres cristãos, que conheciam a causa da queda de seus predecessores, sempre tentaram sufocar as ciências desde o berço. Como a experiência fez ver que os autores dos livros sagrados haviam errado sobre alguns fatos notáveis, concluiu-se pela não-divindade dessas obras,. Indo mais longe, observou-se que esse sistema do mundo tão belo e, na aparência, tão miraculoso não era no fundo senão um arranjo necessário, que não poderia ser de outro modo. Inferiu-se daí que uma causa primeira não seria – se ela existisse – senão uma causa ociosa e inútil. Essas conseqüências evidentes dos princípios mais certos não poderiam deixar de ser fatais para os padres, e eles nada pouparam para interromper o encadeamento que levaria à sua destruição total. Seu ardor em perseguir os sábios não diminuiu, no entanto, o zelo destes últimos: eles não deixaram ao erro o tempo de desfrutar do benefício da prescrição

(Observação minha: quando li, pensei que o autor se referia à recente discussão sobre a liberação do uso de células tronco em pesquisas científicas; só depois lembrei-me que o texto data de 1771)
Anônimo [em Giordano Bruno Redivivo]


Se os homens têm tanta dificuldade para unir a idéia do pensamento com a idéia da extensão, é porque eles nunca viram a extensão pensar. Eles são, com relação a isso, como um homem que nasceu cego é com relação às cores ou como um surdo de nascença é com relação aos sons: estes não conseguiriam unir essas idéias com a extensão que eles apalpam, porque jamais presenciaram essa união.
César Chesneau du Marsais

domingo, 7 de dezembro de 2008

Rápidas & Ácidas (I)

Acabo de concluir a leitura do livro Filosofia clandestina: cinco tratados franceses do século XVIII, traduzido e apresentado por Regina Scöpke e Mauro Baladi e publicado pela Ed. Martins Fontes. Já publiquei neste Blog dois pequenos excertos deste livro, mas penso que há mais provocações que podem nos instigar. Seguem, então, pequenas doses de acidez filosófica:

É o mesmo temperamento em toda parte, mas ocupado com objetos diferentes: Madalena que ama o mundo e Madalena que ama a Deus é sempre Madalena que ama.
César Chesneau du Marsais


Confiai vosso vinho, de preferência, a quem naturalmente não o aprecia, em vez de confiá-lo a quem toma todos os dias novas resoluções de nunca mais se embriagar
César Chesneau du Marsais


Nosso sábio, que não espera nada nem teme nada depois da morte, parecer perder um motivo a para ser um homem honesto durante a vida. No entanto, ele ganha com isso consistência, por assim dizer, e vivacidade no motivo que o faz agir: motivo que é tanto mais forte por ser puramente humano e natural. Esse motivo é a própria satisfação que ele encontra em estar contente consigo mesmo, seguindo as regras da probidade – motivo que o supersticioso só tem imperfeitamente, porque tudo que nele existe de bom ele deve atribuir à graça.
César Chesneau du Marsais


Nós só pecamos porque as luzes são mais fracas que a paixão
César Chesneau du Marsais


Se afastam da justa idéia do filósofo esses indolentes que, entregues a uma meditação preguiçosa, negligenciam o cuidado de seus negócios temporais e de tudo aquilo que se chama “fortuna”. O verdadeiro filósofo não é de modo algum atormentado pela ambição. No entanto, ele quer ter as doces comodidades da vida. Ele precisa – além do estritamente necessário – de um honesto supérfluo, necessário a um homem honesto, e que é a condição para ser feliz. É o fundamento da decência e dos deleites.
César Chesneau du Marsais

sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

Ah! O amor

Na busca por me manter apaixonado - por pensamentos, pelos mundo, pela vida e por alguém - não pude deixar de publicar:

Há algo que vem de repente como um vento num quente anoitecer de verão.
Te pega desprevenido, e te deixa sem tranquilidade.
Persegue você como uma sombra, e é impossível de escapar.
Não sei o que é, então só posso chamá-lo de amor.

Do diário de Yu Hong.


Estou certo que o mundo seria um lugar muito melhor se as pessoas se permitissem apaixonar mais...

Dureza cética

E dizem que ser cético é fácil... (rs)

terça-feira, 2 de dezembro de 2008

Ética em Dussel - evento

Segue abaixo o convite para a última edição deste ano dos Seminários Abertos de Filosofia da Educação, mantidos pelo NEPEFE/USP. O expositor, prof. Claudenir Módolo, é um velho companheiro de estudos dusselianos, tendo sido um dos principais organizadores dos "Encontros Regionais sobre o Pensamento de Enrique Dussel", com edições realizadas na PUC-SP e na Metodista.


NUCLEO DE ESTUDO E PESQUISA EM FILOSOFIA DA EDUCAÇÃO - NEPEFE

A ÁREA TEMÁTICA de FILOSOFIA DA EDUCAÇÃO E
O NUCLEO de ESTUDO e PESQUISA EM FILOSOFIA DA EDUCAÇÃO

convidam para a sessão dos

SEMINÁRIOS ABERTOS DE FILOSOFIA DA EDUCAÇÃO
Temática geral do semestre: O pensamento filosófico-educacional na América Latina

Dia: 04 de dezembro de 2008
14:00-17:00 h. Faculdade de Educação / USP
Av. da Universidade, 308 - Cidade Universitária
Sala 103, Bloco B


Tema do dia:
Enrique Dussel: uma ética da libertação.

Expositor: Claudenir Módolo Alves.

Graduado em Filosofia pela Universidade São Francisco (1998) e em Teologia pela Faculdade de Teologia de Nossa Senhora Assunção (2002) e mestrado em Filosofia pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (2005), tendo elaborado a dissertação Ética da libertação: a vítima na perspectiva dusseliana. É autor de Arte, conhecimento e inclusão digital (Revista Eletrôncia Espiral, v. 19, 2004) e Comunicação, divulgação e Super Cyber (Revista Vox Scientiae, v. 21, 2004).. Atua no campo editorial, junto à Editora Paulus e é docente do Centro Universitário São Camilo.


Orientação de leitura prévia
O expositor recomenda a leitura de parte de sua dissertação [Ética da libertação: a vítima na perspectiva dusseliana], que vai da p. 36 à p. 83 . Ela se encontra disponível no site
http://www.sapientia.pucsp.br/tde_busca/arquivo.php?codArquivo=1547, de onde pode ser facilmente impressa.

segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

E no dia sexto...

Ainda nas primeiras linhas do primeiro livro do primeiro (o velho) testamento bíblico, está descrito como surgiu a humanidade. Foi no dia sexto que Deus criou o homem e a mulher, tal qual sua própria imagem e à sua semelhança. Desta fonte resulta a "teoria" (?!) criacionista da humanidade.
Sobre este assunto, curiosamente, encontrei na Folha de S. Paulo deste domingo, no caderno Folha Ciência, o texto que reproduzo abaixo, de Marcelo Leite. Prefiro não comentar, deixarei para reflexão dos leitores. Que deus nos ajude!

Criacionismo no Mackenzie

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Colégio prega idéia de origem religiosa em aula de ciências
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O Instituto Presbiteriano Mackenzie abrange uma universidade e uma escola das mais tradicionais de São Paulo. Só na unidade paulistana do colégio há mais de 1.800 alunos. Seu campus no quarteirão ladeado pela avenida da Consolação e pela rua Maria Antônia é um ponto de referência na cidade.
Talvez poucos se dêem conta de que se trata de um estabelecimento confessional de ensino. Isso está bem explícito no nome da instituição, porém. Agora o Colégio Mackenzie é também, oficialmente, criacionista.
Criacionismo é a doutrina segundo a qual Deus criou o mundo com todas as espécies que existem hoje. Isso contradiz a explicação darwinista para a diversidade biológica, fruto da evolução por seleção natural. Inúmeras observações comprovam postulados centrais do darwinismo, como a ascendência comum (todas as espécies provêm de um ancestral único).
O fato de o DNA ser a molécula da hereditariedade em todas elas é a melhor prova desse princípio. Os primeiros seres vivos da Terra "inventaram" essa maneira de transmitir características de uma geração a outra, há cerca de 4 bilhões de anos, e ela se perpetuou desde então.
A direção do Mackenzie não nega os avanços da biologia trazidos pelo darwinismo, mas acredita que é preciso opor-lhe o contraditório. Em outras palavras: ensinar a seus alunos que há outra explicação, de fundo religioso, para a origem das espécies.
Quase 200 anos depois de Charles Darwin (1809-1882) e 150 após a publicação de sua grande obra, "Origem das Espécies", os educadores do Mackenzie aceitam só o que chamam de "microevolução" (organismos se adaptam a novas condições do meio).
Não, porém, a "macroevolução" (tal adaptação não seria suficiente para originar novas espécies, em verdade criadas por Deus).
A doutrina criacionista não é apresentada somente nas aulas de religião, mas igualmente nas de ciências. Em 2008 foi usada nos três primeiros anos do ensino fundamental 1, ainda em fase piloto, uma série de apostilas traduzidas e adaptadas de material da Associação Internacional de Escolas Cristãs (ACSI, na abreviação em inglês), com sede no Colorado, nos Estados Unidos.
A coleção utilizada com crianças de 6 a 9 anos se chama Crescer em Sabedoria. Na capa do volume do terceiro ano estava estampado "Ciências - Projeto Inteligente".
É uma alusão ao argumento do "design inteligente": a natureza é tão complexa e os organismos tão perfeitos que só o desígnio de um arquiteto (Deus) pode ter sido responsável por sua criação. "Quando Deus formou a Terra, criou primeiro o ambiente. Criou elementos não vivos, como o ar, a água e o solo. Depois, Deus criou os seres vivos para morarem nesse ambiente", afirma-se na pág. 10. O item 2.1 do volume se chama "O plano de Deus para os ambientes".
Pode ser lido na pág. 17: "Deus projetou as cores e as formas de cada animal e o colocou em um ambiente que era perfeito para eles [sic]. Quando um animal usa suas cores ou formas para se esconder em seu ambiente, dizemos que ele está camuflado".
A direção do Mackenzie justifica a omissão da evolução por seleção natural, nessa apostila de ciências, dizendo que se trata de conteúdo previsto apenas para o ensino fundamental 2. Além disso, o material da fase piloto de 2008 foi revisto e a ênfase religiosa, atenuada, mas não excluída.
Darwin, todavia, continua de fora.
Só uma dúzia de pais reclamou.

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MARCELO LEITE é autor de "Ciência - Use com Cuidado" (Editora da Unicamp, 2008) e de "Brasil, Paisagens Naturais -Espaço, Sociedade e Biodiversidade nos Grandes Biomas Brasileiros" (Editora Ática, 2007). Blog: Ciência em Dia (cienciaemdia.folha.blog.uol.com.br).
E-mail: cienciaemdia.folha@uol.com.br