domingo, 20 de dezembro de 2009

Subterrâneos da democracia

A democracia é um dos maiores - e se não o maior - ídolos do nosso tempo. Não há quem, no mundo ocidental, fale contra seus princípios. Aqueles a quem se quer condenar, chama-se por antidemocráticos (que, equivocadamente, em nosso tempo traduz-se por ditadores, pura e simplesmente).
Mas a democracia é notadamente uma fachada. Discurso hipócrita por se pretender total, absoluto, mas válido apenas parcialmente na realidade prática.
Reproduzo abaixo um texto-denúncia, das ações anti-democráticas praticadas pelos EUA - exemplo da democracia mundial (!?) - em Cuba e Venezuela. A autora é advogada estadunidense, especialista em direitos humanos internacionais e participou da formação da Corte Penal Internacional em Haia.

Agente da CIA é capturado em Cuba

Funcionário de uma empresa de fachada da CIA que financia a desestabilização na Venezuela foi detido em Cuba enquanto repartia recursos para a contrarrevolução.
Por Eva Golinger*


Um artigo publicado no sábado dia 12 de dezembro de 2009 no New York Times revelou que um contratista do governo dos Estados Unidos foi detido em Havana no dia 5 de dezembro enquanto repartia telefones celulares, computadores e outros equipamentos de comunicação com grupos da contrarrevolução. O funcionário, cujo nome ainda não foi tornado público, trabalha para a empresa estadunidense Development Alternatives Inc. (DAI), uma das grandes contratistas do Departamento de Estado, do Pentágono e da Agência Internacional de Desenvolvimento dos Estados Unidos (USAID).
No ano passado, o Congresso dos Estados Unidos aprovou 40 milhões de dólares para “promover a transição para a democracia” em Cuba. Para a DAI foi concedido o contrato principal, o “Programa de Democracia em Cuba e Planificação de Contingências”, que além do mais autorizava o emprego de subcontratistas supervisionados pela empresa DAI. O uso de uma cadeia de organismos é um mecanismo que emprega a Agência Central de Inteligência (CIA) para canalizar e filtrar fundos e apoio político e estratégico a grupos e pessoas que promovem sua agenda no exterior.

A DAI NA VENEZUELA
A DAI foi contratada em junho de 2002 pela USAID para manejar um contrato multimilionário na Venezuela, justamente dois meses depois do fracasso do golpe de Estado contra o Presidente Hugo Chávez. Antes disso, a USAID não operava na Venezuela, nem mantinha escritórios no país. A DAI foi encarregada de abrir o Escritório para as Iniciativas rumo a uma Transição (OTI, sigla em inglês), um braço especializado da USAID encarregado de distribuir fundos multimilionários para organizações favoráveis aos interesses de Washington em países estrategicamente importantes que passam por crises políticas.
O primeiro contrato entre a USAID e a DAI para suas operações na Venezuela autorizava o uso de 10 milhões de dólares por um jornal de dois anos. A DAI abriu as suas portas no setor financeiro de Caracas, O Rosal, em agosto de 2002, e começou imediatamente a financiar os grupos que há apenas alguns meses haviam executado sem êxito o golpe de Estado contra o Presidente Chávez.
Os fundos da USAID/DAI na Venezuela foram repartidos durante esse primeiro ano para organizações como a Fedecâmaras e a Confederação dos Trabalhadores Venezuelanos (CTV), dois dos principais grupos que executaram o golpe em abril de 2002 e que logo encabeçaram uma sabotagem econômica, uma paralisação petroleira e uma guerra midiática com o propósito de derrubar o governo venezuelano. Um contrato entre a DAI e estas organizações, datado de dezembro de 2002, dava mais de 10 mil dólares para o plano de propaganda em rádio e televisão a favor da Coordenação Democrática, a coalizão das forças opositoras ao presidente Chávez.
Em fevereiro de 2003, a DAI começou a financiar um grupo recém criado com o nome Súmate, liderado por Maria Corina Machado, que foi uma das apoiadoras do “Decreto Carmona”², famoso decreto que dissolveu todas as instituições democráticas da Venezuela – desde a Assembleia Nacional, o poder Executivo e o Tribunal Supremo de Justiça, entre outras – durante o golpe de Estado de abril de 2002. O Súmate logo se converteu no principal organismo da oposição que planejava e coordenava as campanhas eleitorais, incluindo o referendo revogatório contra o presidente Chávez em agosto de 2004. Os três principais organismos de Washington que operavam na Venezuela naquele momento, a USAID, a DAI e o “National Endowment for Democracy” (NED), investiram mais de 9 milhões de dólares na campanha da oposição durante esse referendo, sem êxito.
A USAID na Venezuela, que ainda mantém sua principal presença através da OTI e da DAI, tinha previsto uma estadia de não mais de dois anos no país. O então chefe da OTI na Venezuela, Ronald Ulrich, afirmou publicamente ao começo de seus trabalhos, em agosto de 2002, que “Este programa terminará em dois anos, como tem sido com iniciativas similares em outros países; o escritório se fechará após este período”.
Tecnicamente, as OTI são equipes de resposta rápida da USAID, equipadas com fundos líquidos de altas quantidades e com um pessoal especializado para “resolver uma crise” de maneira favorável para Washington. No documento pelo qual se estabeleceu a operação da OTI na Venezuela, se explicava claramente os objetivos, “Nos últimos meses, sua popularidade tem caído e as tensões políticas têm aumentado dramaticamente, já que o presidente Chávez pôs em prática várias reformas controversas. A situação atual aponta fortemente para uma participação rápida do governo dos Estados Unidos”.
Até esta data, a OTI ainda permanece na Venezuela, com a DAI como a sua principal contratista, mas agora com quatro outras entidades que compartilham o bolo multimilionário da USAID em Caracas: o Instituto Republicano Internacional (IRI), o Instituto Democrático Nacional (NDI), Freedom House e a PanAmerican Development Foundation (PADF). Dos 64 grupos que financiavam em 2004 com 5 milhões de dólares anuais, hoje financiam mais de 533 organizações, partidos políticos, programas e projetos da oposição com um orçamento de mais de 7 milhões de dólares anuais. Sua presença não apenas tem sido mantida no país, também tem crescido. Obviamente isto se deve a uma razão muito simples: ainda não conseguiram o seu objetivo original, derrubar o governo de Hugo Chávez.

O DEVELOPMENT ALTERNATIVES INC. É UMA FACHADA DA CIA
Agora aparece em Cuba este organismo de desestabilização, com fundos multimilionários destinados à destruição da Revolução Cubana. O antigo funcionário da CIA, Phillip Agee, afirmou que a DAI, tanto como a USAID e o NED, “são instrumentos da embaixada dos Estados Unidos e por trás destas três organizações está a CIA”. De fato, o contrato da USAID com a DAI na Venezuela dizia especificamente que “o representante local manterá uma estreita colaboração com os funcionários da embaixada para identificar oportunidades, selecionar colaboradores e garantir que o programa mantenha sua coerência com a política exterior dos Estados Unidos”. Não deixa dúvida sobre o seu trabalho de captação de agentes a serviço dos interesses de Washington, nem que sua presença e suas atividades são diretamente coordenadas pela embaixada de Washington.
A detenção do funcionário da DAI é um passo muito importante para frear as ações de desestabilização dentro de Cuba, dirigidas por Washington. Também comprova que não existe mudança alguma com a administração de Barack Obama quanto à política de Washington contra Cuba – seguem empregando e utilizando as mesmas táticas de espionagem, infiltração e subversão como nos anos anteriores.

A VENEZUELA DEVE TAMBÉM EXPULSAR A DAI DO PAÍS

Agora que Cuba desvelou o trabalho de inteligência (captação de agentes, infiltração nos grupos políticos e entrega de recursos para promover a desestabilização são atividades de inteligência) que realizava a DAI na ilha caribenha, o governo da Venezuela deve responder de maneira contundente para livrar seu país desta grave ameaça interna, que durante sete anos e meio tem alimentado com mais de 50 milhões de dólares a desestabilização e a oposição interna. Não é à toa que nos Estados Unidos haja cinco cidadãos cubanos presos por supostos atos de espionagem, mesmo que suas ações não atentassem contra os interesses estadunidenses. Pelo contrário, o funcionário detido da DAI – uma fachada da CIA –, este sim estava atentando contra os interesses de Cuba, promovendo a desestabilização interna e repartindo – de forma ilegal – materiais e recursos de Washington que estavam destinados a alimentar um conflito que provocaria “uma transição política” favorável ao programa dos Estados Unidos. A Development Alternatives Inc. é uma das maiores contratistas de Washington no mundo. Atualmente tem um contrato de 50 milhões de dólares no Afeganistão. Na América Latina, opera na Bolivia, Brasil, Colômbia, Cuba, Equador, El Salvador, Guatemala, Haiti, Honduras, México, Nicarágua, Peru, República Dominicana e Venezuela.

* Eva Golinger é advogada estadunidense, especialista em direitos humanos internacionais e direito de imigração. Participou da formação da Corte Penal Internacional em Haia.
(tradução de Rodrigo Oliveira Fonseca. Original em
http://www.aporrea.org/internacionales/a91659.html)

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