quinta-feira, 30 de agosto de 2007

Sobre a Ditadura

Acaba de ser lançado o livro Direito à memória e à verdade, da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos e da Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República. Trata-se do resultado de 11 anos de pesquisas da Comissão, na parte aberta dos arquivos da Ditadura Militar no Brasil.
Às vezes nos referimos à Ditadura como um período relativamente curto e pertencente a um passado distante. Infelismente não o é. Lembremos que ela durou 25 anos (1964-1989), e terminou há menos de 2 décadas (quantos dos leitores deste blog nasceram, como eu, ainda sob o regime ditatorial?).
O livro tem distribuição eletrônica gratuita, podendo ser acessado neste link.
Méritos aos bons préstimos do nosso governo à história passada e futura do país.
Reproduzo abaixo a Apresentação da obra:

Este livro-relatório tem como objetivo contribuir para que o Brasil avance na consolidação do respeito aos Direitos Humanos, sem medo de conhecer a sua história recente. A violência, que ainda hoje assusta o País como ameaça ao impulso de crescimento e de inclusão social em curso deita raízes em nosso passado escravista e paga tributo às duas ditaduras do século 20.
Jogar luz no período de sombras e abrir todas as informações sobre violações de Direitos Humanos ocorridas no último ciclo ditatorial são imperativos urgentes de uma nação que reivindica, com legitimidade, novo status no cenário internacional e nos mecanismos dirigentes da ONU.
Ao registrar para os anais da história e divulgar o trabalho realizado pela Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos ao longo de 11 anos, esta publicação representa novo passo numa caminhada de quatro décadas. Nessa jornada, uniram-se para um esforço conjunto brasileiros que se opunham na arena política imediata.
Sob a gestão de Nelson Jobim no Ministério da Justiça, durante o governo Fernando Henrique Cardoso, o Estado brasileiro reconheceu sua responsabilidade frente à questão dos opositores que foram mortos pelo aparelho repressivo do regime militar. Papel decisivo nessa conquista tiveram os familiares dos mortos e desaparecidos, com sua perseverança e tenacidade, e o futuro ministro José Gregori, então chefe
de Gabinete do Ministério da Justiça.
O Executivo Federal preparou um projeto que o parlamento brasileiro transformou em lei em dezembro de 1995, criando uma Comissão Especial com três tarefas: reconhecer formalmente caso por caso, aprovar a reparação indenizatória e buscar a localização dos restos mortais que nunca foram entregues para sepultamento. A Comissão Especial manteve uma coerente linha de continuidade atravessando, até o momento, quatro mandatos presidenciais. Durante o governo Luiz Inácio Lula da Silva, a Lei foi ampliada em sua abrangência e praticamente se concluiu o exame de todos os casos apresentados.
Uma dupla face deste Brasil que rompe o século 21 – com sonhos e desafios novos – saltará à vista dos leitores deste livro, sejam eles vítimas do período ditatorial, sejam eles apoiadores daquele regime, sejam juízes, procuradores, parlamentares, autoridades do Executivo, jornalistas, estudantes, trabalhadores, cidadãos e cidadãs de todas as áreas.
Uma face é a do país que vem fortalecendo suas instituições democráticas há mais de 20 anos. É a face boa, estimulante e promissora de uma nação que parece ter optado definitivamente pela democracia, entendendo que ela representa um poderoso escudo contra os impulsos do ódio e da guerra, que sempre se alimentam da opressão.
A leitura também mostrará uma outra face. É aquela percebida nos obstáculos que foram encontrados por quem exige conhecer a verdade, com destaque para quem reclama o direito milenar e sagrado de sepultar seus entes queridos. Na história da humanidade, os povos mais sanguinários interrompiam suas batalhas em curtas tréguas para troca de cadáveres, possibilitando a cada exército, tribo ou nação prantear
seus mortos, fazendo do funeral o encerramento simbólico do ciclo da vida.
Nenhum espírito de revanchismo ou nostalgia do passado será capaz de seduzir o espírito nacional, assim como o silêncio e a omissão funcionarão, na prática, como barreira para a superação de um passado que ninguém quer de volta.
O lançamento deste livro na data que marca 28 anos da publicação da Lei de Anistia, em 1979, sinaliza a busca de concórdia, o sentimento de reconciliação e os objetivos humanitários que moveram os 11 anos de trabalho da Comissão Especial.

Paulo Vannuchi
Ministro da Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República

Marco Antônio Rodrigues Barbosa
Presidente da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos